terça-feira, 3 de maio de 2011

Faça e receba cócegas!



As gargalhadas infantis sinalizam prazer puro, por isso soam maravilhosas aos nossos ouvidos

ELES RIEM e se contorcem. As palavras dizem "não" , mas as risadas convidam à brincadeira, pedindo mais, e a barriga protegida sob a blusa esticada para baixo, o pescoço espremido contra o ombro e os sovaquinhos apertados contra o corpo já ficam sensibilizados só de antecipação aos movimentos imprevisíveis dos dedos do pai ou da mãe. Cócegas são um dos prazeres da infância humana.

E também de gorilas, que pedem cócegas nos pés e então riem guturalmente, sacudindo os ombros; e até de ratos, sobretudo os jovens, que riem em ultrassom quando recebem cócegas na nuca ou brincam uns com os outros, mordendo-se de leve (de novo, em geral na nuca, como fazem os cachorros).

Jaak Panksepp, pesquisador que descobriu que ratos sentem cócegas, notou que os animais que mais riem com as cócegas são também os mais brincalhões. E mais: assim como as crianças, ratos que recebem cócegas voltam e procuram ativamente a mão humana que os fez rir, e preferem a companhia de ratos adultos que ainda acham graça nas cócegas. As cócegas, quem diria, promovem a formação de laços afetivos.

As risadas têm outras funções, claro. Existem as de escárnio, as de puro prazer, as de surpresa com o infortúnio alheio, além das provocadas pelas cócegas. Todas elas, contudo, são sociais: uma maneira de sinalizar para o cérebro alheio se você deseja aproximação ou distância, se sente tranqüilo ou excitado, dominante ou submisso.

Quem ouve a risada, por sua vez, distingue facilmente o estado social de quem ri, sem nem sequer ver seu rosto, como mostrou um estudo feito na Alemanha pela psicóloga Diana Szameitat.

Talvez por isso as gargalhadas das crianças soem tão maravilhosas aos nossos ouvidos: elas sinalizam um prazer puro, tranquilo, um convite à aproximação pacífica -mesmo que na forma da brincadeira quase bruta de fazer cócegas.

Enquanto houver risadas, a interação social é desejada e benvinda, e quem recebe as cócegas associa quem as faz com o prazer da brincadeira: "você me faz rir, então eu gosto de você" Pena que, com a idade, as cócegas deixem de fazer parte do nosso repertório de passatempos. Mas nunca é tarde para voltar à infância. Se você tem filhos pequenos, leitor, eis aqui uma sugestão para esta terça-feira: provoque-os para uma sessão de cócegas - e então deixe que eles façam cócegas em você.


SUZANA HERCULANO-HOUZEL, neurocientista, é professora da UFRJ e autora de "Pílulas de Neurociência para uma Vida Melhor" (ed. Sextante) e do blog www.suzanaherculanohouzel.com