quinta-feira, 16 de junho de 2011

As pessoas se intrometem na criação do seu filho?

É preciso ter jogo de cintura para lidar com a situação, sem se magoar ou ofender alguém.
Por Deborah Trevizan

Toda mãe já passou ou vai passar por essa situação. Parece até que as crianças são um patrimônio público. Todos, de parentes a pessoas que elas nunca viram, acham que sabem mais sobre a educação dos seus filhos. É claro que, às vezes elas, as mamães até precisam de ajuda, mas que tal esperar que peçam? O que acaba acontecendo é que, não raro, a situação fica complicada, dependendo de como se lida com as intromissões. E, quanto maior for o convívio, pior a saia justa.

Com a família, todo cuidado é pouco. Tanto para que os parentes não deixem a mãe insegura quanto para que as respostas e reações não desgastem as relações. “A mãe, que se encontra, muitas vezes, em uma situação de sensibilidade, pode se incomodar ainda mais com os comentários”, avisa o pediatra Carlos Eduardo Corrêa. “É bastante comum, na cultura brasileira, a permissão de palpites acusatórios às mães. O porteiro, o taxista, a senhora no supermercado, os parentes, todos parecem sentir prazer em dizer o quanto a mãe é inadequada ou insuficiente para o bebê.”

Ele ressalta que o amor esconde um lado perigoso nessas relações, em que um interesse, mesmo que legítimo, no bem-estar da criança acaba se transformando em um ataque contra a mãe, que, ferida, não pode ser uma boa cuidadora. “Eu costumo prevenir as mulheres, no consultório, a respeito de eventuais insultos desse gênero para que elas possam se sentir mais poderosas para lidar com seus bebês.” E completa que a mãe deve se orientar pelos seus instintos relacionados ao filho e não estabelecer comparações com outras mães e bebês.

Saber ouvir pode ser a chave do sucesso
Para o pediatra Moises Chencinski, é possível captar coisas boas desses comentários, que, em um primeiro momento, irritam tanto. “Se estivermos com nosso espírito desarmado, podemos sempre tirar algo de positivo de qualquer situação, por mais incômoda que ela possa ser ou parecer. Mas, normalmente, não estamos habituados a receber bem críticas, independente de quem as faça, ou da forma com que tenha sido colocada.” Então a dica é: respire e tente ouvir ou filtrar a informação. Essa opinião é compartilhada pela psicóloga e pedagoga Eliana de Barros Santos. Para ela, a melhor alternativa é filtrar e ouvir o conselho com atenção, além de agradecer a sugestão. Em seguida, a mãe pode dizer que prefere agir a seu modo. “Essas interferências podem levar a uma reflexão e somente se tornam invasivas quando você se permite abalar. Lembre-se de que, no fim das contas, é você quem decide o que deve ou não fazer para que seu filho fique bem.”

Como se sair bem
Especialistas dão outras dicas de como sobreviver aos palpites:
- Quando houver mais insistência do que o necessário ou o desconforto se instalar, é preferível uma saída do tipo: “Obrigada, vou levar em conta essa nossa conversa. Agradeço seu interesse”.
- Se, mesmo assim, houver a insistência, os limites devem ser estabelecidos de forma clara, firme, mas sempre de forma educada e com respeito.
- Outra boa saída é pedir licença, alegando um compromisso, cansaço ou até esclarecendo, mais uma vez, que você já entendeu o ponto de vista.
- Seja delicada, mas, acima de tudo, firme. Um olhar seguro afasta os intrometidos.
- Não justifique suas atitudes, por exemplo: não faço o que você sugeriu porque ele não gosta ou não pode comer determinado alimento. Ao se justificar, você abre espaço para uma discussão. Portanto, nada de justificativa ou explicação.

Passando pela experiência
Para a vendedora autônoma Jobis Estevão, quanto menor o bebê, maiores os palpites de parentes, colegas, conhecidos e até desconhecidos. “Quando eu saía com Mariles, minha filha mais nova, no sling (carregador de bebê), era um tal de estranho vir dizer que ela estava torta, que estava sufocada, que iria morrer. Eu ignorava. Quando, porém, passavam da fala para a ação, eu normalmente dizia, em um tom definitivo: “Tire a sua mão do meu bebê”. A pessoa desistia, me achando uma grossa.”

No caso de Jobis, a situação é ainda mais delicada, pois ela é deficiente visual. Imagine que as pessoas se sentem ainda mais “aptas” a darem sugestões. Mas, como já falamos por aqui, é sempre bom filtrar o que se ouve para ver se não há algo de bom no palpite. Ela conta uma das experiências. “Às vezes, você pode usar uma roupa mais fria ou mais quente do que o ideal porque cada um sente a temperatura de uma forma e, se alguém pergunta se o bebê não pode estar com frio ou com calor, pode ser mesmo o caso de verificar. Gosto de críticas que vêm com explicações. Essas eu valorizo porque me ensinam muito.”

Já, para as insistências, a mãe dá uma dica: “Conheço mulheres que respondem com o clássico ´ah, tá` e confesso que andei praticando. Ninguém resiste a uma série de quatro ´ah, tá`. Talvez não a considerem um primor de receptividade, mas com certeza desistirão da intromissão”, aconselha Jobis.

Quando as atitudes dos filhos incomodam os outros
Isso também pode ocorrer. Você resolve sair de casa com seu filho de 1 ano e meio, no auge de sua energia e curiosidade. Em casa, cada pai e mãe tem suas regras e sua maneira de lidar com a criança. Mas, na casa dos outros, tudo muda. A regra da convivência e da educação exige que os visitantes se adaptem às regras do anfitrião.
Moisés explica que, quando uma criança se comporta de modo que perturbe os donos da casa, isso pode ser reflexo da educação ou de sua situação familiar atual. “Uma criança que assume um mau comportamento, não é repreendida ou contida pelos pais e transpõe limites fica sujeita às sanções do grupo.”

O pediatra completa que, ao presenciar esse tipo de atitude, os pais devem tomar impor limites, desculpar-se com os donos da casa, orientar a criança a fazer o mesmo e, se necessário, oferecer um ressarcimento dos prejuízos causados. Se não houver a possibilidade de conter o pequeno, o melhor é se desculpar e sair do ambiente, voltar para casa e lá tomar as providências adequadas. “Independentemente da idade da criança, é fundamental que ela entenda que suas atitudes não foram corretas”, completa Moisés. Para o pediatra José Martins Filho, tudo é uma questão de saber como a família educa as crianças, já que elas tendem a fazer, na casa dos outros, o que lhes é permitido fazer em sua própria casa. Se há “cuidado, afeto e limites”, seguramente as crianças irão se comportar bem e. “Educar precisa de presença, cuidado, tempo disponível e boa vontade.”

Alternativas
“Se as crianças ficam muito à vontade na casa de alguém que não tem filhos, é bem provável que sejamos invasivos e inconvenientes”, avisa a psicóloga Eliana de Barros Santos. É necessário pensar que o espaço é do outro e deve ser respeitado, sempre buscando se comportar de acordo com as regras locais. A psicóloga Clarissa Khan concorda que é preciso ensinar, desde cedo, regras de convivência aos filhos. Outro conselho valioso da especialista: “Evite fazer visitas em horários em que a criança esteja irritada, com sono, ou fome.”
Garanta sempre que os pequenos tenham diversão sem precisar explorar os objetos da casa. “Leve games, DVDs, cadernos, livros. Vale a mesma estratégia para as ocasiões em que você for receber uma visita”, aconselha Eliana Santos. Para ela, é importante saber perceber quando as situações de estresse podem desencadear pequenos “ataques” nas crianças. “Conhecer seu filho é sempre o maior segredo”, afirma.
A assistente administrativa Emanuela Tackahaschi costuma ser rígida com a filha, Safira, quando o assunto é limite fora de casa. Mas, quando imprevistos acontecem, ela pede mil desculpas e exige que a criança ajude, mesmo que com uma pequena participação, a consertar o estrago.

“Limpar uma parede, por exemplo, faz com que ela entenda que suas atitudes têm consequências. A casa da minha mãe tem muitos enfeites, muita bugiganga para todo lado e a Safira gosta muito de uma cesta de conchinhas. Às vezes, ela a derruba. Eu sempre peço que ela se desculpe e recolha tudo. Quando ela deixa a comida cair no chão, peço que ela limpe com um papel”, exemplifica. É assim que Emanuela impõe limites à filha. E cada família precisa encontrar o seu caminho.

Dicas por idade
Quem é mãe sabe que cada fase reserva uma surpresa. Siga orientações específicas para cada uma delas e evite desastres na residência alheia.

- De 0 a 2 anos: não deixe lápis e enfeites ao alcance do pequeno. Ofereça outras possibilidades de distração.
- De 2 a 3 anos: converse, explique como ele deve se comportar e proponha atividades adequadas para entretê-lo sem perturbar ninguém.
- De 4 a 6 anos: a criança já entende limites. Ultrapassá-los é um sinal de que quer chamar a atenção dos pais ou de outras pessoas. Entender seus motivos é um caminho.


Fontes:
Eliana de Barros Santos – psicóloga e pedagoga, de São Paulo
Moisés Chencinski – pediatra e homeopata, de São Paulo
Clarissa Khan – psicóloga, de Brasília, no Distrito Federal
José Martins Filho – pediatra de Campinas, no interior paulista
Carlos Eduardo Corrêa – pediatra de São Paulo

Publicada no site Bebe.com.br