terça-feira, 13 de dezembro de 2011

Não existe volta ao trabalho, mas sim recomeço profissional

Fernando, Michelle e Miguel.

Por Michelle Prazeres*

* Mãe de Miguel, hoje com 7 meses, Michelle voltou oficialmente a trabalhar quando o filho tinha 5, a partir da sua casa, em sistema home office. Antes disso, quando ele tinha 3, criou um blog e começou a fazer trabalhos como freelancer.

Separação. Esta era a única palavra que me vinha à cabeça quando pensava em voltar ao trabalho depois do nascimento do Miguel, em abril deste ano. Desde a segunda semana de vida do meu filho, a questão profissional começou a me mobilizar. Gastava tempo, energia, emoção e especialmente momentos preciosos ao lado dele pensando em como iria fazer para voltar ao trabalho. Sofri. Sofri. Sofri.

Hoje, trabalhando em um novo sistema, estou convencida de que não existe volta, porque não somos as mesmas depois da maternidade, quando optamos por viver este processo da forma intensa como está sendo para mim. Não existe volta. Existe recomeço. E ele é possível, conciliando as vidas de mulher, mãe e profissional.

Ainda na gravidez, tomei contato com o universo da humanização do parto e da maternidade ativa. Mergulhei tão profundamente nesta história, que em alguns momentos, penso que me fez mal conviver com exemplos que idealizei demais. Confesso que sofri muito tempo achando que se colocasse meu filho num berçário aos 5 meses, eu seria menos mãe. O fantasma do apego tomou conta de mim e nada conseguia me fazer pensar na idéia de me separar dele. A temida separação. Emocional e física, mas especialmente emocional, que aconteceria fatalmente se nos separássemos na volta ao trabalho.

Pensei em parar de trabalhar, coisa que hoje vejo que seria uma solução pesada e sofrida para mim, para o Miguel e para nossa família. Lembro que em uma consulta, quando o Miguel tinha 3 meses, me abri sobre isso com nosso pediatra, o Cacá (http://neonatologiakk.blogspot.com/), e ele me disse: “Calma, Mi. Você vai ser uma mãe de 5 meses quando o Miguel tiver 5 meses”.

Busquei perguntas. Busquei respostas. Busquei exemplos. Busquei apoio. E comecei a experimentar. Encontrei muita gente linda que me ajudou a construir a fórmula que por enquanto vem dando certo. A amiga e querida psicóloga especialista em pós-parto, Cris Toledano (http://cristoledano.blogspot.com/), repetia como mantra: “Mi, trabalhar também é cuidar do seu filho”. E foi esta “chave” que me fez começar a pensar em possibilidades. Seria possível voltar ao trabalho e cuidar dele ao mesmo tempo.

Transformei as minhas angústias em ação.

Em primeiro lugar, quando o Mig tinha 3 meses, fiz um workshop de coaching (http://www.naturalcoaching.blog.com/), que me abriu a cabeça para vários elementos.

Em seguida, comecei a buscar outras mães que tinham passado por um processo de transformação intenso relacionado à vida profissional. Esta busca me moveu a criar um blog, o Empreendedorismo materno (http://empreendedorismomaterno.blogspot.com/). Entrei num novo universo. E minhas angústias iam sendo dirimidas com a ajuda de histórias de mulheres guerreiras e empreendedoras. Até hoje, o blog é fonte de inspiração.

E, além disso, comecei a escrever uma carta para o Miguel sobre as questões que eu estava vivendo. Escrevendo para ele, conseguia dizer coisas que não verbalizava nem para mim. Escrevia e chorava a cada linha, narrando para meu filho, em um documento que nem sei se ele vai ler um dia, tudo que eu estava passando. Esta carta está guardada. E volta e meia, eu volto a escrevê-la. Ela é uma carta infinita... :)

Foram estes alguns dos mecanismos que eu encontrei para viver este momento tão doloroso da forma mais sensível e respeitosa possível. Comigo e com ele e com a nossa família.

Meu marido me apoiava o tempo todo, me questionando, buscando alternativas e me provocando a encontrar dentro de mim as respostas. Sim, elas sempre estão dentro de nós. Assim como nossos limites.

Além das aflições relacionadas à separação, eu tinha mil grilos ligados à amamentação. Queria amamentar exclusivamente ao seio até os 6 meses. E tinha pavor só de pensar em ordenhar e deixar leite estocado. Tinha a nítida certeza de que não teria capacidade e energia alguma para fazer estocagem de leite materno. Hoje, entendo que, na verdade, eu não duvidava da minha capacidade de fazer isso, apenas simplesmente não queria fazer isso.

Recomeço
Respeitando a minha emoção, a minha vontade e as possibilidades financeiras da nossa família (que me impediam de simplesmente cogitar a possibilidade de parar de trabalhar), conseguimos construir um caminho intermediário para a volta ao trabalho. Ou o recomeço.

Aos 5 meses, ao fim da licença maternidade, voltei a exercer minhas atividades profissionais e de pesquisa a partir da minha casa. Antes disso, já escrevia o blog e fazia “bicos” para experimentar outras atividades que porventura pudessem se encaixar na minha nova forma de trabalho. Há dois meses, conto com o apoio da minha sogra, que me ajuda diariamente cuidando do Miguel enquanto trabalho e me acompanha em encontros e reuniões fora de casa.

Ainda o amamento ao seio, mesmo com a introdução alimentar caminhando bem. Isso soa estranho para algumas pessoas. Cheguei a receber proposta de trabalho de gente que não aceitou este formato. “Fazer intervalo na reunião para amamentar? Não. É melhor voltar a te ligar quando ele estiver maior”, ouvi.

Mas felizmente ainda existe gente que entende e apóia a maternidade ativa no mundo do trabalho. E existe gente que acredita que trabalhando assim, respeitando nossa maternidade e aliando-a às atividades profissionais, inclusive os resultados são melhores. Sim, virei uma profissional mais produtiva e mais objetiva. Não tenho tempo a perder! Sobre isso, naquela consulta dos 3 meses, o Cacá também havia me alertado!

Lições
Hoje, vivemos outro tipo de angústia, porque em janeiro, queremos começar uma nova fase: a do berçário. Mas já acho que posso chamar isso de um relato parcial de volta ao trabalho. Parcial, porque o processo é sem fim, e os seus aspectos, múltiplos. Claro que não dei conta de todos eles neste texto. Mas sempre penso que vale a pena compartilhar. Porque para mim, foi e é muito importante ler histórias de outras mães.

Acho importante dividir as lições que este processo me trouxe até aqui.
Umas delas é que sofri muito ouvindo histórias que eu sabia que não poderia ter. Mas este sofrimento foi transformador. Virou uma espécie de “mola” para me impulsionar rumo à minha história, que construí junto com meu filho e meu marido, com ajuda das amigas mães e o apoio da família. Mas aprendi que cada história é uma e que cada maternidade tem seu limite. Eu não poderia abandonar minha carreira (nem temporariamente) para ficar com meu filho por um ou dois anos. Este era meu limite. E a solução foi um modelo intermediário, que tem seus muitos problemas, mas que foi o possível para mim e para nós.

A segunda lição foi esta. Minha maternidade é a possível para mim e para o Miguel. Nem mais, nem menos. Tem que caber todo mundo na conta. E eu cheguei a uma fórmula em que cabe todo mundo.

A terceira lição foi não demonizar a volta ao trabalho. Esta é quase um conselho para outras mães. Sim, quando somos mães de 3 meses, voltar parece impossível. Mas quando somos mães de mais meses (e o tempo vai de cada uma...), voltar (ou recomeçar) é fundamental. E foi bom voltar! Senti-me bem trabalhando, retomando o contato com pessoas queridas, com uma vida ativa que eu sempre tive. No começo, até me senti um pouco culpada por gostar e estar bem no trabalho. Mas esta culpa logo passou!

A outra lição foi a de que é importante poder respeitar o tempo da mãe e do filho. Isso é quase abstrato, mas as duas partes têm que se ouvir muito, dialogar muito. O mundo do trabalho e as lógicas da vida moderna às vezes nos impõem prazos que não são condizentes com esta necessidade (de uma ligação mais emocional e menos pragmática e racional), mas é tão importante este respeito existir!! Conheço mães que sentiram necessidade de voltar aos 2, 3 meses. E não as condeno por isso. As respeito muito.

Mas o meu tempo foi outro. Precisei destes meses a mais. Precisei amamentar meu filho ao seio por pelo menos 6 meses. Precisei encontrar alternativas e trabalhar a partir da minha casa para conseguir me separar dele aos poucos. Na prática, voltei a exercer outras atividades quando ele tinha 3 meses, com o blog, e a experimentar outros formatos quando ele tinha 4. Vejam que ironia! Meu medo de voltar me fez voltar antes dos 5 meses que eu tinha!

Mas foi deste modo que conquistei minha paz interior e a família conquistou harmonia. E só assim vou desmistificando aquele palavrão horrível chamado “separação”. A verdade é que ela vai acontecendo aos poucos. E a gente tem que ter sensibilidade e força para vivê-la e revivê-la. Porque ela tem múltiplas facetas ao longo da vida. E o recomeço da vida profissional é apenas um dos seus formatos.

É por isso é que eu digo: não existe volta ao trabalho. E cada separação que viveremos dos nossos filhos, provavelmente, será um novo recomeço.