segunda-feira, 12 de novembro de 2012

Mães sozinhas

Foto: google / imagens
Tradução do texto de LAURA GUTMAN para o Português de Natalia Salvo
 
Somos muitas no mundo, as mães que criamos sozinhas nossos filhos, ou seja, sem conviver com mais ninguém além da criança. A maioria de nós a princípio não desejou esta situação, e frequentemente a assumimos sem saber muito bem como nos arranjaríamos. Pode ser que tenhamos engravidado estando em uma relação ocasional e, mesmo assim, sentimos que por algum motivo misterioso, esse ser tinha sido gerado e estávamos em condições de abrigá-lo, nutri-lo e levar adiante a gravidez e o parto. Ou de repente pode ter acontecido que a gravidez tenha sido planejada dentro de um relacionamento estável, mas o projeto de continuar juntos não seguiu adiante e portanto, assumimos continuar com a gravidez apesar da perda do homem amado, a dor ou o desamparo. Em muitas outras ocasiões, quem sabe sejam as mais frequentes ocorrem uma separação ou um divórcio com os filhos já nascidos. Pode acontecer do pai abandonar definitivamente a cria, por diversos motivos, e as mães não só assumam a criação, mas também a sobrevivência dos filhos, no sentido econômico da questão. A maioria das mulheres, ainda em situação de risco, de falta de dinheiro ou de maturidade emocional, ou mesmo na solidão, permanece com seus filhos.
 
Para abandonar uma criança, o desespero, o fato de nos sentir à beira de um abismo, a solidão extrema e o medo inundaram nossas vidas. Em compensação, se temos o mínimo de consciência de nossas capacidades de nutri-lo, se temos confiança em nós mesmas e principalmente, se recebemos de alguma forma apoio e acolhimento, permaneceremos com nosso filhos ainda que seja em condições muito desfavoráveis.
 
A solidão é, quiçá, o pior panorama para criar uma criança. No entanto, mais além de todas as dificuldades reais e muito concretas, ser uma “mãe sozinha” tem sim, algumas vantagens. A principal vantagem é que sabemos que estamos sozinhas. E os outros também sabem disso. O fato de que a solidão seja palpável e visível, nos permite pedir ajuda a quem estiver ao nosso redor com relativa facilidade. Este fato, que aparenta ser uma obviedade, não é quando estamos vivendo com alguém. Às vezes, o sentimento de solidão é imenso estando dentro de um casamento, mas nesses casos não é fácil reconhecê-lo, nem muito menos que o nosso entorno nos entenda como alguém sozinho e necessitado de receber companhia e apoio.
 
Quando criamos nossos filhos sozinhas, e além disso, quando trabalhamos porque somos as únicas provedoras do dinheiro, não temos outra opção a não ser contar com os outros. Algumas mulheres recebemos apoio de nossas famílias, onde o apoio se constitui naturalmente: podem ser nossas mães ou nossos pais que estejam presentes, que ofereçam ajuda econômica ou inclusive, na sua função de avós, cuidem diretamente das crianças. Às vezes tem uma irmã que atua como um apoio, um grupo de amigas solidarias, ou uma rede laboral que equilibra a solidão e a resolução de problemas domésticos. Há circunstâncias onde não temos condições de pagar uma ajuda doméstica ou um berçário muitas horas por dia. Ou existe uma madrinha da criança que se compromete uma vez por semana a cuidar dele. O chefe no trabalho se torna especialmente solidário porque sabe que somos uma “mãe sozinha”. Nossas amigas se organizam os finais de semana, nos convidam a reuniões e preparam as comemorações de aniversário de nossos filhos. Longe disso ser uma situação ideal, mas resgatemos o fato de que a “solidão” é clara para todos, principalmente para nós mesmas. E dada esta clareza, podemos atuar logo na sequência.
 
Quase todas as pessoas se tornam solidárias com uma mãe sozinha que cria seus filhos, porque todos podemos imaginar o enorme esforço que isso demanda, além dos obstáculos que tem na vida cotidiana uma mãe que precisa cumprir a diversidade de papeis, e para que as crianças estejam bem cuidadas e bem atendidas. Essa solidariedade coletiva, é possivelmente, uma das principais vantagens. E se essa é a nossa realidade, vale a pena considerá-la.
 
Há também outras vantagens menores: quando o bebê é pequeno, as mães podem ter – se forem emocionalmente capazes – toda a disponibilidade afetiva para a criança. Isso porque não haverá demanda por parte do companheiro, de atenção para ele: nem de cuidados, nem ter que ouvi-lo, nem requerimentos domésticos. Ou seja, se formos capazes de nos fundir nas demandas e necessidades do outro, será completamente em benefício da criança pequena, em vez de nos dividir entre os pedidos de uns e outros. Este também não é um ponto menos importante – ainda que não estejamos acostumadas a falar abertamente sobre as ambivalências na hora de atender nosso companheiro – quando ele reclama atenção e carinho, enquanto o pequeno bebê aguarda sua vez. Este “esgotamento” que sentimos quando desejamos satisfazer as necessidades alheias, costuma ser frequente quando estamos acompanhadas, e muito mais leve quando nos ocupamos ”somente” do bebê.
 
Outro fato que se dá muito mais naturalmente quando estamos sozinhas, é o se deixar fluir no contato corporal com a criança, principalmente à noite. Quando o cansaço nos aflige, quando somente queremos dormir e não temos mais forças, quando a criança chora pedindo contato e carinhos… e então não há ninguém para nos dizer o que é certo fazer, e o quê não se deve fazer. Não há ninguém para opinar a favor ou contra, ninguém para dar conselhos, ninguém para ajudar – mas ao mesmo tempo, ninguém para colocar-se no meio disso tudo. Simplesmente deitamos na cama com a criança em nossos braços, tentando dormir o quanto antes. Isso com a criança agarrada em nosso corpo e sem incomodar ninguém.
 
Parece uma obviedade, mas não é. A maioria de nós, mães que vivem acompanhadas e querem tentar dormir de noite, trazem seus filhos para a cama e se deparam frequentemente com a negação do companheiro, seja por se sentir prejudicado, ou por medo, por incômodo ou por sentir que não é parte desse vínculo. No entanto, as mães sozinhas – em circunstâncias semelhantes – podem decidir unilateralmente a melhor maneira de atravessar as noites, que – isso todas nós sabemos – podem constituir a parte mais dura da criação de nossos filhos.
 
É lógico que estar sozinha na criação e na vida cotidiana não é maravilhoso. Todos precisamos de uma companhia, interação e diálogo. Ainda mais se estamos criando filhos pequenos. Por isso, se temos alguém, nos veremos na obrigação de imaginar outros tipos de apoio e ajudas, para que nossa experiência maternal seja o mais feliz possível, e para que as crianças recebam o amor e o acolhimento que merecem.
 
Pessoalmente, acredito que a melhor opção quando não há um companheiro ou alguém que dê apoio, é a rede de mulheres. Tenho certeza que fomos criados como espécie de mamíferos para viver em comunidade, e que ao longo da história constituímos tribos ou aldeias para compartilhar a vida. Hoje em dia os centros urbanos se converteram no pior sistema para criar as crianças, já que as mães estão cada vez mais sozinhas e isoladas, portanto as crianças têm poucas pessoas às quais recorrer em seus rituais cotidianos.
 
Precisamos reinventar um esquema antigo, mas com parâmetros modernos, sempre que haja um conjunto de mulheres criando filhos. Não importa quantas, já que uma só mãe não consegue criar uma criança. Mas cinco mães juntas podem criar cem crianças. O segredo está no conjunto, na solidariedade, na companhia e no apoio mútuo.
Nenhuma mulher deveria passar os dias sozinha, com uma criança nos braços. A maternidade é fácil quando estamos acompanhadas. Não julgadas, nem criticadas, nem aconselhadas. Simplesmente junto de outras pessoas, e na medida do possível, junto de outras mulheres que estejam experimentando o mesmo momento vital. Quando as mulheres estão trocando conversas, brincadeiras, choros ou lembranças com outras mães, resulta muito mais leve permanecer com nossos filhos.
No entanto, se estamos sozinhas, acreditamos que não somos capazes, e supomos que deveríamos deixar as crianças aos cuidados de outras pessoas para poder “ocupar-nos de nós mesmas”. Frequentemente não percebemos que o problema está na solidão de permanecer junto à criança. Não em nossa incapacidade de amá-los. Por isso, insisto: é responsabilidade das mulheres reconhecer que precisamos voltar a nos reunir, que se funcionamos coletivamente e dentro de círculos femininos, a maternidade pode resultar em algo muito mais suave e doce. E que uma “mãe sozinha” é aquela que não é compreendida, apoiada, nem incentivada, ainda que ela conviva com muitas pessoas. E “mãe acompanhada” pode ser uma mulher que não tenha alguém a seu lado, mas que, no entanto, conte com o aval de sua comunidade.