segunda-feira, 11 de março de 2013

Todas as mulheres tem leite?

Foto: Google imagens
Por Dr. Carlos González 


Todas as mulheres têm leite? Claro que não! Existem mulheres que não têm insulina, que não enxergam, que não podem caminhar… como não existem mulheres sem leite? 

A glândula mamária é um órgão e pode sofrer doenças, o mesmo que o coração ou que os rins, pode funcionar mal ou deixar de funcionar. 

O que não pode ser é que existam tantas mulheres sem leite como pensam. Poucas mães deixam de dar o peito porque querem. A maioria o faz "porque o leite foi embora" ou "porque o bebê ficava com fome" ou "porque meu leite não era bom". Não é possível que a metade ou o terço de mulheres não tenham leite, não é possível que seus peitos não funcionem. Se fosse verdadeiro, estaríamos ante a mais terrível epidemia que a humanidade viveu. 

A hipogalactia – escassez de leite – deveria ser uma doença tão rara como qualquer outra, digamos como a diabetes ou a hipertensão. Bem visto, deveria ser muito mais rara. Por uma parte, a seleção natural não atua contra a hipertensão. Uma mulher hipertensa pode ter tantos filhos vivos como uma mulher normal. Ao contrário, a seleção natural é implacável com a hipogalactia: se a mãe não tiver leite, seus filhos morrem salvo que sejam adotados e amamentados por outra fêmea – o que é enormemente raro na natureza. Faz apenas um século que os bebês começaram a sobreviver sem o leite materno. 

Por outra parte, diabetes pode ter em qualquer um: uma menina, um ancião, uma mulher com graves deformações genéticas. Mas nenhuma delas pode ter hipogalactia. Para saber se você não tem leite, primeiro você necessita de um bebê. Uma mulher com idade fértil (em teoria ente uns 12 a 55 anos, mas quase sempre entre 18 e 40, a melhor idade da vida) suficientemente saudável de corpo e de mente para ficar grávida e dar a luz… Estamos falando de mulheres com uma excelente saúde. E é muito azar que justamente o peito não lhes funcione. Pode ocorrer, é certo, mas é muito raro. Tanto que há de descartar primeiro todas as demais possibilidades. 

O problema é que a nossa sociedade não confia na lactância. Chegamos a pensar que o normal é não ter leite e que se alguma tem, é só por a mais extraordinária das coincidências, Quando você pergunta a uma grávida quanto tempo pensa em dar o peito, raramente responde algo concreto, "três meses" ou "um ano e meio". Muitas vezes dizem: "enquanto possa" ou "enquanto tenha leite". Não acreditam que dependa delas, que possa tomar a decisão e levá-la à prática, acreditam que são um brinquedo do destino. Quando minha esposa dava o peito, suas amigas não lhe perguntavam: "como você consegue?" "me explica como se faz?", "eu também quero dar o peito a minha filha!". Ao contrário: "Que sorte você tem! Você tem leite! Quem dera eu tivesse tido leite também"… 

A insegurança é tão grande que, passe o que passe, a mãe costuma pensar que não tem leite. Se o peito está vazio é "porque não tem leite", mas se está "cheio é porque o bebê não mama" e provavelmente com razão, porque o "leite deve ser mal". Se o bebê pede o peito com muita frequência, é porque "está passando fome", mas se dorme muito é que "como não sai nada". Se engorda pouco é que "necessita de uma mamadeira", mas se engorda muito "não terá bastante com o peito". Os peitos pequenos "não servem", mas os grandes, também não. Se a mãe foi criada com mamadeira, "é que em minha família não temos leite", mas se a avó ou a bisavó amamentou a sete filhos: "Quem dera eu tivesse leite como minha avó, que depois de dar o peito aos seus sete filhos, adotou uma órfão durante a guerra e lhe deu também." Mas, claro, as "mulheres não temos leite". Em conclusão, não existe nenhuma circunstância que faça exclamar às mães: "Tenho muito leite". 

Na imensa maioria das vezes em que a mãe acredita que não tem leite, na realidade não existe nenhum problema. Estatisticamente, é mais provável ganhar a loteria que ter hipogalactia. Nem os peitos murchos, nem o bebê que se desperta pela noite, nem um aumento de peso que alguém comentou que é pouco, mas na realidade é normal, nem que não aguenta três horas, indicam falta de leite. 

GONZÁLEZ, C. (2009). Comer, Amar, Mamar. Madrid: Temasdehoy, p.369-371.