quarta-feira, 22 de maio de 2013

A alergia alimentar do João – meu relato

Marcella, Adriano e o João.

Depois que o João nasceu, nosso pediatra disse: “Bebês são muito perebentos, tá? Não se preocupem e nem queiram resolver isso, eles precisam se acostumar ao meio aéreo depois de tanto tempo mergulhados”. Logo vimos o João ficar perebento. E pela aparência, eram as famosas brotoejas. Mas depois veio um ressecamento na pele do rosto. Continuamos tranquilos, achando que aquilo não era nada. Éramos tão sossegados que nos esquecemos de marcar consulta de um mês pra ele. E na de dois meses descobrimos que havia algo errado. 

Cacá olhou pra ele e disse: “Isso está com cara de alergia alimentar”. Hein? Nunca tínhamos ouvido falar nisso. Ele só mamava no peito, muito e sempre, eu jorrava leite, e leite materno não é a coisa mais maravilhosa do mundo pra um bebê? Sim, é. Mas alguma coisa que eu comia e era repassada ao João por meio dele causava esses ressecamentos. E uma dor de barriga que eu já havia classificado como cólica de bebê, coisa normal, e medicado com luftal. Numa ligação, antes dessa consulta, já havíamos perguntado o que fazer e ele sugeriu que eu parasse de ingerir leite e derivados por uns dias. Na ocasião eu parei, por 4 dias, mas pra mim era tão difícil ficar sem meu café com leite de manhã, que isso eu tomava, achando que não faria diferença. 

Na consulta de dois meses, o pediatra nos disse, então, que eu precisava fazer testes com a minha alimentação, excluindo algumas coisas e depois retomando. Que tavez fosse bom começar com leite e derivados ou com algum alimento que eu ingerisse todos os dias, mas também tentar o gluten, os ovos, as castanhas e outros. Explicou que não adiantava eu cortar por apenas 4 dias, nem ingerir em pequenas quantidades. Que algumas alergias não são dose-dependentes, ou seja, são deflagradas mesmo com um pouquinho só do alérgeno. 

Lá fomos nós pra casa, meio assustados, achando tudo aquilo meio estranho. Nunca tínhamos ouvido falar daquilo. Mas comecei com os testes, pelo mamão – única coisa que eu comia todos os dias. Nada aconteceu. João continuava chorando, nervoso, sem conseguir dormir, com a pele super seca. Passei pro leite. Nada (ufa, era meu maior medo a essa altura, eu amo leite e queijos). Farinha branca. Ele pareceu melhorar um pouco. Gluten. Pronto, sentimos uma melhora considerável. Na consulta dos três meses, fomos animados, achando que o problema estava resolvido. Se foi um mês desafiador para pais recém-chegados ao mundo, vocês podem imaginar, então, pra um bebê também recém-chegado, cheio de coceiras (sendo que só descobrimos que coçava depois, quando ele já conseguia levar os bracinhos pra cabeça e pro rosto), dor de barriga, cansaço (porque não conseguia dormir). Eu o levava comigo para todo lugar, no sling, amamentava em livre demanda (como faço até hoje), tentando acalmá-lo. Mas eu também precisava de calma. Estava perplexa com tudo aquilo. E se já era chato escutar na rua as perguntas de gente que nem me conhecia (do tipo: “Nossa, o que ele tem no rosto????”), imaginem passar o dia tentando explicar pras pessoas queridas – visitas, parentes, amigos – o que o João tinha e porque eu não podia comer isso e aquilo. Que não, não tinha nenhum remédio pra ele tomar. Que não, não era melhor dar leite de fórmula. Que não, não existia nenhum exame de sangue definitivo que resolveria a situação. Que não, não era melhor consultar outro pediatra. Que não, aquilo não era normal de bebê recém-nascido e logo ia passar. Eu tinha vontade de chorar a cada pergunta e comentário, e me segurava. Ao menos no começo, eu ainda me segurava. Mas chegou uma hora em que parei de me segurar, porque não dei mais conta. 

Mesmo depois de identificarmos o gluten e de eu retirá-lo completamente da minha alimentação, o João piorou novamente. O ressecamento chegou a ponto de tomar as perninhas e bracinhos, além do rosto e da cabeça. Ele era todo vermelho. Não parava de berrar. E num dia assim, de crise, liguei pro Cacá e disse que precisava de um antialérgico urgente praquele momento. Ele me passou Polaramine e uma pomada pra ressecamentos mais sérios. Fui comprar na hora, enquanto pensava que aquilo era reação ao shoyu: eu havia comido nos três dias anteriores. 

Depois de alguns dias, o João melhorou um pouco, mas não sarou. Mesmo sem shoyu. Se antes chegou a dormir três horas seguidas à noite (nunca foi de dormir de dia nesse início), não ficava mais dez minutos de olhinhos fechados. Nem no berço, nem na nossa cama, nem no colo. Só duas coisas o acalmavam um pouco: o peito e um pandeiro que até hoje fica no quarto dele, apesar de não ser exatamente um brinquedo. Detalhe: Polaramine dá muito sono. Cortamos e percebemos que talvez o João estivesse reagindo ao próprio remédio. Seguimos com a medicação antroposófica que também já estávamos administrando e pareceu que ele melhorou um pouco. 

Cacá nos indicou uma médica antroposófica que fazia um exame no cabelo do alérgico e identificava alimentos que estivessem “em excesso” no organismo. E claro, como se tratava de antroposofia, ela dava atenção a questões emocionais de nós três. Pesquisei um pouco a respeito antes de marcar a consulta, que no começo achamos cara – e pensávamos que ainda poderíamos fazer mais testes de alimentação. Ouvi umas duas opiniões a respeito do exame e da médica e decidimos esperar mais um pouco. Mas as coisas só pioravam. Não conseguíamos curtir, porque estávamos sempre com sono, tristes, nervosos. Ouvíamos o João berrar mesmo quando ele estava quieto. Não aguentávamos mais falar do assunto. Não queríamos mais encontrar as pessoas. Eu já começava a ter reações irracionais, como sentir raiva do meu marido por ele ter histórico de alergia – porque eu não tinha, e muitas vezes essa tendência é hereditária. Mas fazia todo o esforço do mundo pra arejar minha cabeça, ia ao Cine Materna com ele, usava e abusava do apoio incondicional da minha mãe (mas até ela duvidava do diagnóstico do João, e ficava quieta na maior parte do tempo porque via como eu ficava arrasada de ter que falar no assunto). 

Marcamos a consulta com a dra. Regina. Saímos de lá com a certeza de que valia muito mais do que ela cobrou. Conversamos muito, falamos de tudo, fomos muito acolhidos. Fizemos o exame e saí de lá com uma lista enorme de restrições alimentares. Carne vermelha, feijões, uva, pêssego, leite e derivados, industrializados e muuuito mais. Apesar da tristeza, eu me sentia firme para tentar cortar tudo aquilo e, depois, voltar aos poucos com alguns itens. Confiei no tratamento, porque ela realmente parecia saber do que estava falando. E sabia. Mas nós sabíamos muito também, e mais, porque éramos os pais dele. E àquela altura não tínhamos essa consciência ainda. 

No mesmo dia liguei pro Cacá pra contar da consulta. E concluí que não valia a pena ficar sem leite e derivados. Eu já tinha certeza de que não era esse o alérgeno e, se pudesse ao menos mantê-lo na lista, sofreria um pouco menos. Ainda assim, eu aprendi a fazer leite de amêndoas e tomávamos, Adriano e eu, com gosto. 

Nos primeiros dias, apesar de já sofrer com as restrições (e de ter que falar pra minha mãe o tempo todo: “não mãe, não posso comer isso”), resolvi aprender com aquilo. Mudar nossos hábitos alimentares, experimentar coisas novas, acrescentar ao nosso cardápio semanal coisas que não consumíamos sempre. Troquei os feijões por lentilha (que eu adoro mas só comia no Ano Novo), o pão por tapioca, os industrializados por frescos. Minha diversão era buscar opções em mercados especializados, tentar adaptar receitas. A fome ainda era grande, por causa da amamentação. Então eu tinha muito que inventar. E minha mãe foi incrível: fez muitas receitas adaptadas para me agradar. Lembro do dia em que ela conseguiu fazer um bolo de chocolate com calda e tudo. Não tinha açúcar, industrializados, glúten (e acho que nem leite). Comi três pedaços, feliz da vida. O Adriano comia o que eu podia comer. Dizia sempre: “Estamos juntos nisso, Má. Vamos lá, vamos jamais era muita coisa de uma vez só. Passou uma semana e o João não melhorou nada. Eu, que já não podia nem ter vida social – porque tinha fome o tempo todo e só podia comer em casa, além de não querer mais falar do assunto com ninguém -, também não podia cozinhar o que mais gostava. Tomar um vinho. E nem assim via meu filho bem. Ninguém dormia. Se não fosse pelas minhas amigas Laura, Natália e Tatiana, que vieram em casa cozinhar pra mim um menu delicioso que eu podia comer – e pela Bianca, que me chamava pra ir na casa dela e fazia um almoço tão gostoso também, dentro da minha dieta – eu não teria tido nada de vida social nessa fase, mesmo. Cheguei a ir numa festinha infantil na qual a única coisa que eu podia consumir era água. 

Liguei pra médica e ela se surpreendeu por ele não ter melhorado nem um pouquinho. Sugeriu mais um medicamento antroposófico (ele já estava tomando vários e nós também). Não me lembro se eu dei, mas acho que não. 

Numa quarta-feira, hora do almoço, estava sozinha com o João. Acho que ele tinha uns três meses e meio, quatro (me perdi completamente nessa conta). Coloquei ele no carrinho para esquentar minha comida e ele começou a berrar. Eu comecei a sentir raiva dele. Ignorei o choro. Continuei esquentando a comida. Comi, com raiva, rápido, sem nem sentir o gosto. Ele berrando. Mandei uma mensagem pro Adriano: “Chega, pra mim não dá mais”. Ele ligou desesperado e disse que estava indo pra casa. Assim que ele entrou, eu saí da cozinha e fui pro quarto. João berrando. Eu estava meio que em um transe. Deitei e cochilei. O Adriano pegou o João e depois entrou no quarto perguntando se podíamos ir no Cacá. Ele tinha ligado lá. Eu não queria nem responder. Por mim, tanto fazia. Naquela hora, senti vontade de morrer. Juro. Era como se eu estivesse amarrada e sem previsão de ser solta. Como se o meu maior sonho, o da maternidade, tivesse se tornado um pesadelo horrível, no qual eu já tinha dificuldades de amar meu filho. Não queria mais acolhê-lo, queria apenas ser acolhida – em algum lugar bem distante dele. Não queria mais amamentá-lo. Não queria mais nada. 

Fui levada pro Cacá. Não tocava no João. Na sala de espera, me joguei no sofá segurando o choro. Assim que ele apareceu, me disse: “Essa é a Fernanda. Vocês podiam conversar”. Era a mãe do Tomás, que também sofria de alergia. Ali trocamos algumas ideias e contatos. Depois nos encontramos e descobri que aquilo era o mais importante para nós: trocar experiências. 

Na consulta, eu não falava. Até que, depois de alguma pergunta do Cacá, eu disse que não ligava pra mais nada. Ele me olhou sério e falou que era melhor eu buscar terapia. Que aquele discurso era depressivo e que eu precisava me cuidar. Falou pra eu parar com a dieta, devagar, reinserindo os alimentos aos poucos na minha rotina e observando as reações do João. Mas o glúten eu não retomaria. E nos mandou pra praia. 

Adriano ligou pro irmão dele, João Claudio, que nos emprestou a casa. Até hoje acho que ele nem imagina o quanto aquilo foi importante pra nós! Foram 4 ou 5 dias de alívio. O João seguia sem dormir (àquela altura só havia um jeito de dormirmos um pouco: nos revezando a madrugada toda, cada hora um com o João no braço), mas eu comi um brigadeiro. Olhamos o mar, ficamos em silêncio, falamos um monte, nos lembramos o quanto nos amávamos. O quanto desejamos aquele bebê, o quanto estávamos aprendendo com aquilo tudo. Tínhamos certeza da nossa força. Sabíamos que não tínhamos recebido aquilo tudo à toa. Era, certamente, porque dávamos conta de suportar. E pensávamos: tem tanta coisa pior… 

Infelizmente, a volta pra São Paulo era necessária. O Adriano, que tem sua empresa própria, já não trabalhava direito havia meses. E precisava estar presente. Estávamos bem melhores, mas o primeiro dia em São Paulo já foi mais difícil de novo. 

Mas era muita coisa de uma vez só. Passou uma semana e o João não melhorou nada. Eu, que já não podia nem ter vida social – porque tinha fome o tempo todo e só podia comer em casa, além de não querer mais falar do assunto com ninguém -, também não podia cozinhar o que mais gostava. Tomar um vinho. E nem assim via meu filho bem. Ninguém dormia. Se não fosse pelas minhas amigas Laura, Natália e Tatiana, que vieram em casa cozinhar pra mim um menu delicioso que eu podia comer – e pela Bianca, que me chamava pra ir na casa dela e fazia um almoço tão gostoso também, dentro da minha dieta – eu não teria tido nada de vida social nessa fase, mesmo. Cheguei a ir numa festinha infantil na qual a única coisa que eu podia consumir era água. 

Liguei pra médica e ela se surpreendeu por ele não ter melhorado nem um pouquinho. Sugeriu mais um medicamento antroposófico (ele já estava tomando vários e nós também). Não me lembro se eu dei, mas acho que não. 

Numa quarta-feira, hora do almoço, estava sozinha com o João. Acho que ele tinha uns três meses e meio, quatro (me perdi completamente nessa conta). Coloquei ele no carrinho para esquentar minha comida e ele começou a berrar. Eu comecei a sentir raiva dele. Ignorei o choro. Continuei esquentando a comida. Comi, com raiva, rápido, sem nem sentir o gosto. Ele berrando. Mandei uma mensagem pro Adriano: “Chega, pra mim não dá mais”. Ele ligou desesperado e disse que estava indo pra casa. Assim que ele entrou, eu saí da cozinha e fui pro quarto. João berrando. Eu estava meio que em um transe. Deitei e cochilei. O Adriano pegou o João e depois entrou no quarto perguntando se podíamos ir no Cacá. Ele tinha ligado lá. Eu não queria nem responder. Por mim, tanto fazia. Naquela hora, senti vontade de morrer. Juro. Era como se eu estivesse amarrada e sem previsão de ser solta. Como se o meu maior sonho, o da maternidade, tivesse se tornado um pesadelo horrível, no qual eu já tinha dificuldades de amar meu filho. Não queria mais acolhê-lo, queria apenas ser acolhida – em algum lugar bem distante dele. Não queria mais amamentá-lo. Não queria mais nada. 

Fui levada pro Cacá. Não tocava no João. Na sala de espera, me joguei no sofá segurando o choro. Assim que ele apareceu, me disse: “Essa é a Fernanda. Vocês podiam conversar”. Era a mãe do Tomás, que também sofria de alergia. Ali trocamos algumas ideias e contatos. Depois nos encontramos e descobri que aquilo era o mais importante para nós: trocar experiências. 

Na consulta, eu não falava. Até que, depois de alguma pergunta do Cacá, eu disse que não ligava pra mais nada. Ele me olhou sério e falou que era melhor eu buscar terapia. Que aquele discurso era depressivo e que eu precisava me cuidar. Falou pra eu parar com a dieta, devagar, reinserindo os alimentos aos poucos na minha rotina e observando as reações do João. Mas o glúten eu não retomaria. E nos mandou pra praia. 

Adriano ligou pro irmão dele, João Claudio, que nos emprestou a casa. Até hoje acho que ele nem imagina o quanto aquilo foi importante pra nós! Foram 4 ou 5 dias de alívio. O João seguia sem dormir (àquela altura só havia um jeito de dormirmos um pouco: nos revezando a madrugada toda, cada hora um com o João no braço), mas eu comi um brigadeiro. Olhamos o mar, ficamos em silêncio, falamos um monte, nos lembramos o quanto nos amávamos. O quanto desejamos aquele bebê, o quanto estávamos aprendendo com aquilo tudo. Tínhamos certeza da nossa força. Sabíamos que não tínhamos recebido aquilo tudo à toa. Era, certamente, porque dávamos conta de suportar. E pensávamos: tem tanta coisa pior… 

Infelizmente, a volta pra São Paulo era necessária. O Adriano, que tem sua empresa própria, já não trabalhava direito havia meses. E precisava estar presente. Estávamos bem melhores, mas o primeiro dia em São Paulo já foi mais difícil de novo. 

Algumas passagens da história estão bem confusas na minha cabeça. Não me lembro exatamente quando fomos a uma terapeuta específica fazer nossa constelação familiar – um método que muito nos impressionou e que nos fez tratar de questões essenciais que certamente muito tinham a ver com a alergia do João. Também não me lembro quando ele começou a melhorar, nem quando me dei conta de que o glutamato monossódico, que está presente no shoyu e causava alergia no João, estava presente em vários outros temperos prontos que, por mais que não entrassem em minha casa, eram usados em restaurantes e bares onde, a certa altura da dieta, eu já podia comer. E claro, na casa das pessoas. Também não me lembro quando exatamente decidimos que eu não ia mais amamentar e que tentaríamos dar um leite específico para alérgicos – decisão imediatamente revista quando o pediatra disse: “Mas se não sabemos nem identificar tudo o que causa alergia nele, vamos trocar o seu leite por um cheio de química?”. Por mais estranho que pareça, mesmo no meio daquele furação, eu senti um certo alívio por não ter essa saída. Na real, eu queria muito continuar amamentando. 

O que sei é que, quando o João fez seis meses, muita coisa mudou. Ele já estava bem melhor e era hora de começar a introdução alimentar. Isso tudo era motivo pra muita alegria: eu havia conseguido chegar aos 6 meses de amamentação exclusiva e feito o melhor pro meu filho e pra mim, com isso; por conta disso, já começaria uma fase em que eu poderia ter mais tempo pra mim, porque ele logo não precisaria mais mamar tanto assim; seria um prazer enorme oferecer comida pra ele, vê-lo experimentar os legumes; eu contaria, a partir de então, com a ajuda da Marly, que o Adriano contratou para cuidar do João de segunda a sexta. 

Terapia começada, esquema montado, vida nova. Ainda não dormíamos, mas criamos coragem para tentar fazer o João dormir no berço de novo – e não só porque não aguentávamos mais dividir o espaço com aquele bebezão (que, com tudo isso, nunca teve problemas de ganho de peso), mas porque eu sofria de dores terríveis nas costas e percebemos que, com o peito por perto, ele nem sequer queria cochilar. Não foi imediato, mas logo ele se acostumou novamente a dormir no berço e o sono durava bem mais do que quando estava entre nós. 

João demorou muito para dormir uma noite inteira. E mesmo quando isso aconteceu, foram apenas 5 seguidas: foi só viajarmos no Natal e no Reveillon que ele voltou ao ritmo anterior. Vimos que, ao contrário do que havíamos planejado (nota mental: não dá pra planejar o comportamento de um outro ser, gente rs), o João só dormia com silêncio absoluto, escurinho, peito e no quartinho dele. Ok, filho. Faremos assim então, pra você aprender a dormir. 

Ele aprendeu (mas ainda acorda, uma ou duas vezes, dependendo da fase). Hoje, ainda não temos coragem de levá-lo pra viajar. Mas logo tentaremos. A introdução alimentar foi um sucesso e ele é um comilão. Reagiu à banana, ao ovo e a leite e derivados – coisas que, se eu consumo, não causam nada a ele pelo meu leite. Um mistério? Sim. Alergia é assim mesmo, e sinceramente, não queremos nem saber porque. No começo, fizemos como na preparação para o parto: lemos de tudo, conversamos com muita gente, pesquisamos pra valer. Com o tempo, percebemos que precisávamos relaxar, também. Que não existem respostas prontas pra tudo na vida. E a libertação: que não precisamos dessas respostas todas. A situação, hoje, já está sob controle. Então, se ele reage a algo, simplesmente não damos mais. Daqui a um tempo testamos novamente. E pronto. 

Eu já como gluten. João não reage mais, mas percebi que eu fico bem melhor sem. O plano é fazer “desintoxicações” quando eu sentir necessidade, porque cortar da vida já é um passo mais difícil que não quero dar agora. Nossos hábitos alimentares, que já eram bons, melhoraram muito. Sou a louca do rótulos, olho tudo o que tem em um produto antes de comprá-lo. E aprendemos um monte com isso. Somos mais leves (eu emagreci um monte, inclusive) e sinto um orgulho imenso quando vejo meu guerreirinho comendo o pratão de abobrinha, bifum, batata, peixe, lentilhas, couve, cenoura e tudo o mais que colocarmos. Ele come muito bem. 

Não demos vacinas até hoje, decisão super tranquila, e só o tratamos com homeopatia (mas até aqui foi só um resfriado e umas febrinhas de dente). Não posso nem imaginar o que poderia ter acontecido com o João se ele tivesse sido vacinado nas primeiras horas de vida, como acontece com a grande maioria dos bebês. E defendo, também por isso, a vacinação a partir dos 6 meses de idade (é o tempo que temos para conhecer melhor nossos bebês e entender do que eles precisam nesse começo de vida). 

São muitas as lições que tivemos até aqui. O João já tem um ano e parece que vivemos dez. Somos pais muito mais seguros. Tenho a sensação de ser inabalável. E a certeza de que as melhores pessoas para entenderem do que o João precisa somos nós. Mas de que, pra chegarmos nisso, precisamos ter em nosso caminho o apoio do melhor pediatra desse mundo (sim, ele é, temos certeza ), que nunca nos deu uma resposta pronta. Agradeço muito a ele por isso. 

E as conexões e conclusões que fazemos sobre tudo o que passamos são constantes. Tenho certeza de que, ouvindo os relatos de mais pais, isso acontecerá mais e mais vezes. Que riqueza ser mãe de um bebê alérgico. Não achei que um dia fosse dizer isso. 

Marcella