quarta-feira, 18 de maio de 2016

Duas mães: assuntos da maternidade para além do sono ou colo

** Texto por Joana **

Ser mãe é extraordinário. Desde o primeiro dia de gravidez. Tudo muda de assalto e continuamente: o corpo, o lugar social e familiar, a intensidade das emoções, a organização do pensamento. E todas essas transformações são acompanhadas inevitavelmente de muitas dúvidas. 

Diante delas mergulhamos num mundo de informações sobre gestação, parto, amamentação, alimentação, educação... Existe uma infinidade de sites e palpites sobre todos esses assuntos, que prometem responder todas as perguntas e apontar os caminhos certos e principalmente os melhores: Pra que você seja a melhor mãe do mundo, seus filhos sejam perfeitos, geniais e principalmente capazes de ganhar muito dinheiro quando crescerem. Sim, assim que nascem os bebês já tem que ser competitivos!

Bom diante disso, percebemos que não queríamos esse mundo, esses conselhos, essa perspectiva. Então começamos a procurar pessoas, encontros - menos informação e mais troca de experiências. Primeiro encontramos a Caza da Vila, as consultas coletivas de gestantes organizadas pela Betina foram fundamentais para entendermos de forma singular meu processo de gestação. Essa troca criava um espaço possível de exposição das diferenças e semelhanças dos processos, que aos poucos ia gerando um lugar de cumplicidade muito delicado, potente e acolhedor. Éramos o único casal de mulheres do grupo e estranhamente esse dado não fazia assim tanta diferença. Graças a esse espaço consegui a segurança e o apoio necessário para fazer meu parto do jeito que eu queria. Cercada de amor e cuidado. Minha filha nasceu e eu renasci com ela. 

Achamos ingenuamente que o mais difícil tinha passado mas é claro que nossa nova vida tava só começando...

Dois meses depois tive uma mastite, nossa filha perdeu peso e de novo uma enxurrada de informações e conselhos protocolares nos assaltaram. Procuramos o Espaço Nascente e com Cacá reencontramos a escuta, um olhar atento, preciso e afetivo. As crises são muito reveladoras se a gente não foge delas. E de novo se não fosse pela vivencia de um espaço de troca acho que teríamos cedido às fórmulas e perdido a chance de olhar pra gente e pras transformações em curso. 

Agora nossa filha tem um ano e os desafios continuam! Dois meses atrás começamos a experimentar no Espaço Nascente, com Cacá, consultas pediátricas em grupo de famílias constituídas por duas mães. Esses encontros nos fazem pensar no tempo em que os conhecimentos eram passados de mãe pra filha, de avó pra neta, num tempo onde a ciência não era tão tirânica e que a intuição não era sinônimo de ignorância. A experiência da dupla maternidade por ser algo ainda novo, pouco experimentado parece que nos abre uma fresta para as sensibilidades singulares. Estamos apostando nesse caminho.

Fonte da Imagem : Etsy
Parece que este grupo de "mamães e papaias" pode ser um lugar para encontrar essa sensibilidade, um lugar de troca sobre os problemas gerais da infância e os problemas específicos da nossa condição de duas mães. Mas isso nos faz pensar que nem sempre é claro onde está a fronteira que cria as nossas diferenças, se um casal homossexual tem especificidades que merecem ser tratadas num grupo particular, etc. 

Por nossa experiência no encontro, entendemos que a maioria das nossas preocupações da dupla maternidade têm a ver com o futuro das nossas filhas, como elas irão ser recebidas na escola ou pelos amigos. Nossos assuntos específicos têm mais a ver com visibilidade e relação com a sociedade do que com os nossos problemas atuais de alimentação, sono ou colo.