quarta-feira, 14 de junho de 2017

Encontro com Cacá no SESC Pompéia!

Na última semana tivemos o enorme prazer de participar de um potente encontro familiar, pelo Projeto Afetos, uma iniciativa do SESC.

São conversas, vivências e oficinas destinadas às mães, pais, familiares e responsáveis por crianças na primeira infância. Realizados uma vez por mês no Espaço de Brincar, os encontros tem enfoque em temas relacionados à maternidade, gestação, cuidados e educação de bebês e crianças pequenas.



Começamos nosso encontro como uma vivência sensorial, inspirada em uma atividade antiga do Ministério da Saúde, que costumo trazer de volta de tempos em tempos, que tem como objetivo colocar o adulto no lugar de alguém que está sendo cuidado. Uma ação objetiva para o despertar empático da vivência do bebê enquanto pequeno ser totalmente dependente de nossas atitudes.Chama-se atelier sensorial.

De olhos fechados, algumas mães receberam estímulos sensoriais com diversos materiais. Você já viveu essa experiência? De ser tocado por um objeto que não sabe do que se trata? De escutar um som que poderia ser um acalento, mas que de repente te assusta? De ter um alimento colocado na sua boca sem saber exatamente o que é, e nem ter a chance de entender se gosta dele ou não?



Após a pequena vivência, pudemos conversar em grupo como esse momento do cuidado com o bebê é um lugar de desconhecidos, mas com grandes oportunidades de reconhecimento. "Vou pegar você, vou tirar a sua fralda, agora é hora de usar o algodão molhadinho..." às vezes as pequenas narrativas orais, uma coisa tão natural para o mundo dos adultos, são esquecidas no cuidado dos pequenos. Por que?

Vamos resgatar a consciência de que estamos tratando com pessoas como nós?

Em seguida, pudemos abrir a roda para uma grande oportunidade de conversa com as mães e pais presentes. E adivinha? Os temas que apareceram parecem ser aqueles mais constantes também no consultório. O que confirma nossa experiência prática: a mater-paternidade é uma vivência de aspecto coletivo, muito embora o tempo todo estejamos nessa valsa de olhar para as questões individuais.



Trago aqui algumas das reflexões que tivemos:

Uma mãe de recém nascido relata dificuldades com amamentação. Ela está consumindo informação de grupos de apoio ao aleitamento mas sente-se preocupada em não atingir um ideal proposto, onde ao bebê não poderia de maneira alguma ser oferecido complemento de leite artificial. Ela luta com a relactação como forma de manter o bebê exclusivamente no seio materno, mas em coletivo, demonstra ganhar a consciência de que as histórias de aleitamento também passam por questões extremamente individuais.

Refletimos sobre limites: qual é a necessidade daquele bebê? É verdade que se ele for para a mamadeira poderá desistir do peito? Qual é a disponibilidade emocional dessa mãe de se manter em estado de investimento constante para a amamentação, quando relatou que ainda luta com as dificuldades que teve no parto?

Para além das respostas certas, na temática da amamentação, é sempre desejável procurar as perguntas certas. 

Em seguida, uma mãe relatou que o pai do bebê sente-se com muita vontade de participar dos cuidados básicos, insistindo em dar sucos ou chás na mamadeira. O bebê tem quatro meses e a mãe não se sente confortável com essa necessidade do marido.

Nada está perdido! No desejo desse pai, há um grande pedido de participação. Claro que para um bebê que cresce bem, em aleitamento exclusivo e cuja mãe está totalmente disponível para assim o manter, não há a necessidade de sucos ou mamadeiras. Será que o banho no colo poderia oferecer para o pai a oportunidade de contato visceral que ele procura? Já pensaram em massagens ou até mesmo em delegar todo esse momento íntimo do banho como forma de criação de vínculo com ele?

Depois ouvimos um pouco sobre os dilemas da mulher que, injustamente em nossa sociedade, precisa criar antecipadamente novos recursos para se separar do filho e voltar ao trabalho. É o fim da licença de quatro meses: meu bebê vai ficar bem? 

Novamente, tentamos sempre olhar para as situações não ideais como momentos ideais para NOVAS oportunidades de crescimento para a família toda. Nos bebês que vão para a creche, ou ficam com um cuidador, ou vão para a casa da avó, encontramos também felicidade. Sim, se amados e bem cuidados eles ficarão bem! Nessa mulher que sofre a separação, poderemos enxergar a força de reconstrução de uma nova vida: essa nova mulher gosta desse trabalho? Ele é importante para essa família? Existe a possibilidade de mudar? Ela quer essa mudança?

Fizemos uma pequena jornada de reconhecimento também desses pequenos privilégios, de estar em um lugar onde se as possibilidades existem, devemos aproveitá-las. Se não existem, estamos vivendo aquilo que nos é possível. Sem dúvida, a maternidade possível é mais sadia do que a luta para a vivência da maternidade ideal.

Eis que chega o tema de ouro: meu bebê não quer comer!
Percebemos que quando tratamos de parto, cuidados básicos e amamentação, estamos ainda muito focados em um protagonismo do adulto. Aquele que decide como, quando, onde vai executar as coisas, e que de alguma forma (que pode ser empática ou não) envolve a criança em seus projetos sem muita escuta.
Mas quando um bebê cresce e começa comer, vemos uma pequena disputa de protagonismo: agora ele pode fechar a boca, dizer não, recusar a comida!

O tempo todo dialogamos com o ideário da boa mãe. A boa mãe é aquela que tem um filho que dorme bem, come bem, não dá trabalho. Está incutido em nosso inconsciente coletivo de que esses RESULTADOS significam uma boa atuação materna. Só que não!

É urgente desconstruir o mito da boa mãe, exatamente para preservar também a saúde da criança.
Confiamos nesse bebê como uma pessoa que sabe se tem ou não tem fome?
Que entende o momento da refeição, não como nós adultos, calculando calorias e quantidade de sódio, bem como balanceamento nutricional, mas como uma experiência sensorial de afeto, prazer e de ser e estar no mundo?

Vimos mães carinhosas, abertas, dispostas, preocupadas.
Mães que dão peito e que dão mamadeira. Que cortaram o açúcar ou que não entraram nessa questão. Mas todas elas, boas mães, na medida que constroem relações de cuidado com seus filhos considerando que são relações de humanidade. Hora serenas e plenas, hora extremamente desgastantes.

A abordagem da pediatria, na  minha ótica, tem que ser essa.
Um trabalho de construção de confiança na potência de todos os indivíduos envolvidos.