quinta-feira, 31 de agosto de 2017

O Pai Plástico

Nos últimos anos temos acompanhando um enorme esforço - pilotado pelo amplo alcance das redes virtuais que conectaram pessoas, ideias, angústias, causas - para refutar ideias pre-concebidas de maternidade.

"Mãe é Mãe "
"Mãe é tudo igual" 
"Mãe é padecer no paraíso" 
"Mãe é amor"

E tantas outras ideias que cabem em frases de efeito passam por uma intensa revisão na sociedade contemporânea. Com isso, estamos possibilitando desconstruir os esteriótipos de mãe, e encontrar novos caminhos para a construção da maternidade individual e coletiva. As mães que queremos ser, que podemos ter, que merecemos. Sem paraísos ou infernos possíveis. Mãe pé na terra mesmo. Mãe que eu posso e quero ser!

Nessa luta inglória não é incomum que o paradigma da mãe se confronte com o do pai. Claro que na nossa sociedade temos um abismo que separa os gêneros e papéis pré-designados para eles, e portanto tamanha confusão quando tratamos disso. Tipo cartas marcadas. Nasceu para esse papel!

Em um primeiro momento esse arquétipo de pai foi largamente criticado pela força que constrói socialmente essa mãe (legitimamente, vamos lembrar que 30% das mães criam os filhos sozinhas). Apareceu esse pai ausente, descomprometido. Revelou-se a grande falha masculina na nutrição afetiva dessa família. Ser homem no sentido mais masculino envolvia uma ausência afetiva, que nunca combinava com o papel de Pai.

Começamos a assistir, na emergência de rever como nascer e como nutrir nossos filhos, uma figura masculina cada vez mais presente, apesar de muitas vezes não saber qual espaço ocupar.

Curioso é que o tiro pode ter saído pela culatra: ao invés de promover a reflexão, inspiração e movimentação em torno de um novo paradigma para a paternidade, estamos vendo o surgimento de um pai imaginário, muito próximo daquilo que toda a maternidade vem fazendo um esforço para desconstruir: o Pai Plástico!

Quando assisti pais nascendo em outro lugar, em outro compromisso afetivo, ou seja lá qual nome dar ao amor envolvido em se descobrir Pai, não imaginei que logo apareceria uma nova profissão rentável : Pai e paternidade qualificada! Pai Plástico !



Desumanizado, ele é como que uma resposta maquinária para essa demanda da sociedade por pais presentes. Ele sabe tudo de criança, palestra sobre amamentação ou assuntos pertinentes, sabe dar conta de puerpério e de todas as questões novas que aparecem porque ele sabe resolver problemas. Tem receitas infalíveis para tudo que for relacionado à educação, fala até sobre maternidade. É emocionalmente disponível, nunca se perde em conflitos, e altamente qualificado para essa nova profissão: ser pai perfeito na contemporaneidade! 

Como um profissional de saúde da família, eu preciso registrar que o pai plástico é um excelente parceiro apenas para a mãe perfeita. E esse casal só cria filhos de mentira, muito angustiados pela própria imperfeição. As crianças ansiosas por poderem viver uma humanidade de conflitos inerentes e os seus pais com fórmulas de perfeição.

Se o peso de ser perfeita é insuportável para as mulheres, se a invisibilidade é também sufocante para as crianças, nada de bom virá da construção de um modelo de pai de alta performance como pede a sociedade de consumo. Não estou criticando aqui alguém, nem um grupo específico de pais. Estou sim chamando a atenção para o fato de que a fórmula mágica não existe, assim como as fórmulas lácteas não são perfeitos substitutos do leite materno. Estou sim propondo um espaço reflexivo para que cada pai recém-nascido posso se arriscar a encontrar seu próprio caminho. 

Com plasticidade, sem ser de plástico.
Que sejam bons pais os pais presentes afetivamente e que de fato estejam envolvidos na criação de seus filhos.

Sem esteriótipos.
Sem outra retribuição que não seja filhos que tem pais presentes !